Oposição retira confiança politica ao presidente do Parlamento cabo-verdiano
Praia, Cabo Verde (PANA) - O Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV), maior força da oposição no país, anunciou esta quinta-feira que retira a confiança política ao presidente da Assembleia Nacional (Parlamento), Jorge Santos, acusando-o de falta de imparcialidade.
Segundo a bancada parlamentar do PAICV, Jorge Santos tem estado a beneficiar o grupo parlamentar do Movimento para a Democracia (MpD, maioria).
Através de uma declaração política feita pelo líder parlamentar, Rui Semedo, o PAICV criticou a atitude do presidente da Assembleia Nacional na condução dos trabalhos parlamentares durante os quatro anos que já dura a legislatura iniciada, em 2016.
A posição assumida por Rui Semedo vem na sequência de vários episódios, nos últimos meses, com críticas do partido oposicionista à atuação do presidente daquele órgão de soberania, indicado para o cargo pelo MpD.
“Hoje, o próprio grupo parlamentar do PAICV deve reconhecer, de forma clara e inequívoca, que tolerou tempo demais os desmandos na governação desta Casa, que é de todos nós, e que simboliza a representação popular”, afirmou o deputado.
Para o líder do grupo parlamentar do PAICV, o presidente Jorge Santos “não tem sabido ser o presidente imparcial e equidistante de todos os deputados" e que, por este facto "deixou de merecer a confiança” do seu partido.
“Assim, da nossa parte, Vossa Excelência se desobriga do compromisso constitucional e passa a ser apenas mais um deputado da sua bancada e ao serviço do MpD”.
Jorge Santos foi eleito presidente da Assembleia Nacional após as eleições legislativas de 2016, que afastaram o PAICV do poder (desde 2001), com o apoio daquele partido, passando o MpD a ter maioria absoluta no Parlamento.
“Hoje, quatro anos depois, não restam dúvidas que nos enganamos. Enganamo-nos na escolha, enganamo-nos na esperança em como iria melhorar, enganamo-nos em deixar acumular os sucessivos erros, sem haver da nossa parte uma atitude mais enérgica perante uma situação que se revelou irremediável desde o início”, acusou Rui Semedo.
O último de vários episódios e atritos entre o PAICV e o presidente do parlamento resultou de críticas do partido à forma como Jorge Santos aceitou receber um único relatório do Governo (MpD) sobre a execução do Estado de Emergência.
Este período de exceção foi decretado de março a maio (com renovações), para travar a transmissão da pandemia da covid-19. O PAICV defendia que deveria ser apresentado um relatório por cada período de Estado de Emergência.
“O presidente do Parlamento revelou cedo que não se dá bem com a Constituição da República, lei magna deste país, que jurou respeitar, defender e fazer aplicar, protagonizando um dos factos mais graves da história do parlamento cabo-verdiano, quando presidiu uma das sessões plenárias ao mesmo tempo que estava a substituir o Presidente da República”, disse ainda Rui Semedo.
Ele acrescentou que Jorge Santos “elegeu, desde cedo, como alvo a abater a começar pela presidente do PAICV [Janira Hopffer Almada, deputada] que, ao que tudo indica, obedeceu a uma estratégia do seu partido para a destruição da sua imagem, para comprometer a concorrência política, normal em democracia, e para fragilizar a oposição democrática”.
Acusou ainda o presidente do Parlamento de ter demonstrado “vezes sem conta”, que “não se dá bem com o regimento da Assembleia Nacional” e “que várias vezes violou de forma grosseira, deliberada e intencional, em favor do Governo ou em favor da maioria parlamentar”.
Segundo ele, os deputados "são tratados de forma desigual e discriminatória” por Jorge Santos, e que "os da oposição não merecem o igual respeito que é dado aos da privilegiada maioria”, acusando-o também de “discriminação” da bancada do PAICV.
Na reação à declaração política do PAICV, a líder parlamentar do MpD, Joana Rosa, acusou o PAICV de pretender, a menos de um ano das próximas eleições legislativas, “afundar o Parlamento”, mostrando que “esta oposição está sem agenda” e que pretende “acabar com o presidente da Assembleia Nacional”.
Joana Rosa acusou mesmo o PAICV de ter uma “bancada bagunceira”, garantindo que Jorge Santos vai manter-se na presidência da Assembleia Nacional, dado o apoio maioritário do MpD.
“Vai manter-se com a legitimidade que tem, com o apoio integral e sem qualquer reserva desta bancada”.
Por seu lado, o líder da União Cabo-verdiana Independente e Democrática (UCID, oposição com três assentos parlamentares), António Monteiro, considerou a declaração política do PAICV “forte”.
Realçou que os ataques pessoais na política "não beneficiam os partidos" e que os mesmos "só servem para dificultar a condução dos trabalhos na casa parlamentar e o desempenho dos deputados no desenvolvimento do país".
A UCID, avançou, reconhece as falhas do presidente da Assembleia Nacional no desempenho das suas funções, assim como dos deputados nacionais, afirmando que se almejam melhorar as coisas é preciso tolerância e que cada um reconheça seus erros.
Entretanto, o presidente da Assembleia Nacional ainda não reagiu à posição do principal partido da oposição, tendo os trabalhos sido suspensos ao fim de mais de uma hora de forte discussão e troca de acusações entre as duas bancadas.
-0- PANA CS/IZ 25jun2020