Governo considera inalterável acordo de defesa e segurança com Estados Unidos
Praia, Cabo Verde (PANA) – O Governo de Cabo Verde considera "meramente virtual" a inconstitucionalidade apontada a um artigo do acordo de defesa e segurança com os Estados Unidos, e , por isso, vai manter o segmento da norma em causa sem alterações, declarou quinta-feira na cidade da Praia o ministro dos Negócios Estrangeiros e Comunidades de Cabo Verde, Luís Filipe Tavares.
Tavares manifestou esta posição do Executivo em conferência de imprensa, na cidade da Praia, um dia após o Tribunal Constitucional (TC) ter declarado "inconstitucional" um segmento de um artigo do Acordo de Estatuto de Forças (SOFA, sigla em inglês).
Conforme o chefe da diplomacia cabo-verdiana, o Governo congratula-se com o teor do acórdão do TC, sublinhando que o mesmo “dá satisfação praticamente total às posições adotadas.”
Enfatizou que o acórdão declara "inconstitucional" apenas um segmento de um artigo.
Se este for interpretado num certo sentido, prosseguiu, a imunidade de jurisdição atribuída ao pessoal dos Estados Unidos permitiria a instalação de um tribunal marcial americano no território cabo-verdiano, de acordo com o governante.
“Trata-se, assim, de inconstitucionalidade meramente virtual”, sublinhou o ministro, garantindo que o artigo não dá permissão aos Estados Unidos para instalarem qualquer tribunal seu, marcial ou outro, em Cabo Verde.
O governante garantiu que “tal interpretação nunca foi adotada por quem quer que seja e, sobretudo, nunca esteve nem está no pensamento das partes no SOFA”, sublinhando que “nada, no acórdão, belisca a existência, a validade e a vigência do SOFA”.
Segundo ele, o acordo “constitui um marco essencial nas relações históricas entre Cabo Verde e os Estados Unidos da América e cria condições para a sua elevação a patamares superiores, em conformidade com os interesses estratégicos e fundamentais do nosso país.”
Questionado se o texto do segmento do artigo considerado inconstitucional vai sofrer alterações, Tavares foi taxativo: “O acordo fica como está. Estamos totalmente à-vontade e o acordo continuará em vigor. Os órgãos de soberania de Cabo Verde estiveram muito bem.”
Porém, o Partido Africano de Independência de Cabo verde (PAICV, principal da oposição), que tinha feito um pedido de fiscalização da constitucionalidade de algumas das normas deste acordo, considerou "uma vitória", o facto de o Tribunal Constitucional lhe ter dado razão, ao declarar a inconstitucionalidade de um artigo do SOFA.
“É que o PAICV sempre esteve convicto de que havia normas que colocavam em causa a Constituição da República de Cabo Verde”, salientou o partido numa nota publicada na sua página oficial.
“Vitória também extensiva à cidadania atenta aos direitos civis, políticos e sociais dos Cabo-verdianos que, na altura, através de um grupo que subscrevera um abaixo-assinado a requerer à Provedoria da República um pedido de fiscalização das normas do SOFA, consideradas anticonstitucionais”, prosseguiu o partido, liderado por Janira Hopffer Almada.
“E quem, mais uma vez, fica mal na fotografia é o Governo que já deu bastas provas que não dialoga, não ausculta, nem procura consensos necessários em matérias estruturantes”, terminou.
No ponto 4 do acórdão, o Tribunal Constitucional declarou “sem redução do texto, a inconstitucionalidade do segundo segmento do número 2 do artigo III do Acordo sobre o Estatuto das Forças dos Estados Unidos da América”, por entender que “permite o exercício de poderes tipicamente jurisdicionais sobre o seu pessoal em território cabo-verdiano por crimes praticados durante a estadia destas forças no arquipélago, em violação do princípio da soberania nacional.”
O acordo estabelece um quadro de parceria e cooperação aplicável ao pessoal e aos contratantes dos Estados Unidos da América que estejam temporariamente em Cabo Verde, no âmbito de visitas de navios, formação, exercício, atividades humanas e outras.
O acordo foi ratificado em setembro do ano transato pelo Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca.
Por sua vez, o chefe do Estado cabo-verdiano disse não ter vislumbrado no SOFA qualquer matéria, que lhe tenha suscitado fundadas dúvidas sobre a sua constitucionalidade.
Fez questão de referir que o acordo é “suscetível de ser sempre criteriosamente reavaliado na sua execução.”
-0- PANA CS/DD 09julho2020