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Governo acusado de "crimes eleitorais" em Cabo Verde

Praia, Cabo Verde (PANA) - A Comissão Nacional de Eleições (CNE) de Cabo Verde encaminhou para o Ministério Público queixas apresentadas pelos partidos da oposição (PAICV e UCID) contra o Governo, por atos denunciados que violam os deveres de neutralidade e imparcialidade e constituem crimes eleitorais, apurou a PANA de fonte segura.

Conforme as deliberações n.º 65 e 66/eleições legislativas/2021, publicadas no site da CNE, os fundamentos das queixas dos dois partidos concorrentes às eleições de 18 de abril proximo têm a ver com a realização de cerimónias públicas de apresentação de projetos e lançamentos de estudos, promovidas pelo Governo.

A União Cabo-verdiana Independente Democrática (UCID), partido na oposição com três assentos parlamentares, refere-se ao lançamento do projeto de construção do centro de Saúde de Ribeira das Patas, em Porto Novo, na ilha de Santo Antão, e ao lançamento da segunda fase do porto também no Porto Novo.

Por sua vez, o Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV), principal forca da oposição, denunciou a apresentação pública do estudo preliminar de localização do aeroporto de Santo Antão.

Analisadas as queixas, a CNE considerou que os atos apontados pelos partidos não se enquadram no n.º 7 do artigo 97.º do código eleitoral, que proíbe a realização de cerimónias públicas de lançamento de primeiras pedras ou inauguração.

Contudo, analisou os atos praticados pelo Governo à luz dos deveres gerais de neutralidade e imparcialidade, consignados no n.º 2 do mesmo artigo, no sentido de se averiguar se os mesmos, direta ou indiretamente, favorecem ou prejudicam um concorrente às eleições, em detrimento ou vantagem de outros.

“Estes deveres não podem ser entendidos como incompatíveis com a normal prossecução das atribuições das entidades públicas, mas exigem que, no período eleitoral, estas entidades prossigam em exclusivo o interesse público, posto por lei a seu cargo de forma objetiva”, realçou.  

Posto isto, entende a CNE que atos de apresentação pública promovidos pelo Governo constituem promessas de realizações futuras, com claro conteúdo de promoção político-eleitoral, suscetíveis  de interferir no pleito eleitoral em curso e favorecer direta e indiretamente a candidatura do partido que suporta o Governo em detrimento dos demais.

E por considerar que tais atos constituem violação do nº 2 do artigo 97º do código eleitoral previsto e punido como crime eleitoral nos termos de artigo 290.º sobre violação dos deveres de neutralidade e imparcialidade, a CNE determinou, por unanimidade dos membros, a participação dos factos ao Ministério Público.

Igualmente determinou a notificação ao Governo no sentido de se recomendar às entidades públicas a não realização de ato desta natureza durante o período eleitoral.

A CNE mandou  também suspender a moratória governamental para baixar ou isentar as rendas sociais das famílias afetadas pela pandemia, alegando que pode “favorecer” o partido que suporta o Governo nas próximas eleições legislativas.

De acordo com uma deliberação do plenário da CNE, adotada por unanimidade em 17 de março corrente, publicada sexta-feira, em causa está também uma queixa apresentada pelo PAICV, alegando que a medida aprovada pelo Governo, publicada a 05 de março corrente, violava o Código Eleitoral e tinha “claras motivações de propaganda eleitoral enganosa”.

Além de dar provimento à queixa, ordenando a suspensão da medida até 18 de abril, data das eleições legislativas, “reforçando as condições de uma disputa igualitária entre as diferentes candidaturas”, a CNE ordenou, igualmente, a participação do caso ao Ministério Público, para “efeitos de averiguação e responsabilização criminal”.

“A isenção do pagamento do valor da renda traduziria num ato do Governo com vantagem ou benefícios a particulares, potencialmente ficariam mais propensos a aderir às propostas de governação do partido que sustenta o Governo, e candidato às eleições de 18 de abril, o que, acontecendo, constitui claramente a prática de um ato pelo Governo com potencialidade de favorecer o partido político no poder (Movimento para a Democracia) que o sustenta em detrimento dos demais, com recurso a bens públicos, violando assim o dever de neutralidade e imparcialidade”, lê-se na deliberação da CNE.

O Governo cabo-verdiano decidiu isentar durante um ano o pagamento de rendas em habitações sociais às famílias sem rendimentos, e às restantes vão ver o valor reduzido, até a nove euros por mês, devido às consequências económicas da pandemia.

A medida, que se aplica a milhares de habitações de renda social que sob a gestão direta dos municípios ou dos gabinetes públicos de realojamento, abrange as “famílias já realojadas e por realojar”, conforme a resolução de 05 de março corrente, aprovada pelo Conselho de Ministros.

Desde logo, é estipulado que, nos casos comprovados de perda do rendimento total do agregado familiar, em consequência da perda de emprego ou com rendimento mensal de até  cinco mil escudos (45 euros), estas famílias ficam isentas do pagamento da renda social, o mesmo acontecendo nos casos de desemprego anteriores à pandemia da covid-19.

É ainda fixado que, nos casos dos agregados familiares com um rendimento total acima de cinco mil  escudos (45 euros), passa a ser cobrada uma renda social mensal de mil escudos (nove euros), e de 10 mil a 15 mil escudos (90 a 135 euros), a renda passa a ser de dois mil escudos (18 euros), enquanto, para os rendimentos de 15 mil a 25 mil escudos (135 a 225 euros), a renda é fixada em três escudos (27 euros) e nos rendimentos superiores a 25 mil escudos (225 euros) baixa para quatro mil escudos.

-0- PANA CS/DD 26mar2021