Futuro nasce de união no passado, diz José Maria Neves
Praia, Cabo Verde (PANA) – O futuro nasce da união no passado, e os povos de Portugal e das colónias estiveram na mesma trincheira contra a ditadura portuguesa, declarou o Presidente cabo-verdiano, José Maria Neves.
“Hoje são novos os desafios e horizontes numa conjuntura mundial cada vez mais complicada. Vagas migratórias fogem da violência e de novas prisões”, acrescentou quarta-feira última o estadista cabo-verdiano.
Ele falava na abertura das comemorações em Cabo Verde dos 50 anos de libertação dos presos políticos detidos pelas autoridades coloniais portuguesas no Campo de Concentração do Tarrafal, na ilha cabo-verdiana de Santiago.
Defendeu o reforço da democracia com humanidade.
A seu ver, a democracia requer “cuidados permanentes para que nunca mais se fale de campos de concentração.”
Ao discursar na cerimónia, decorrida precisamente nas instalações do antigo campo de concentração (hoje museu e candidato a Património Mundial da UNESCO), o Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa destacou “o museu que se quer vivo para testemunhar o que não queremos que seja o presente, nem o futuro.”
Trata-se, prosseguiu, duma tarefa essencial, sobretudo para os jovens de amanhã saberem aquilo que devem rejeitar sempre.
"Não há confusão possível entre opressão e liberdade, entre ditadura e democracia”, realçou.
Do seu lado, o chefe do Estado da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, prestou homenagem, inclinado perante a memória dos presos políticos.
No mesmo contexto, o ministro da Defesa de Angola, João Ernesto dos Santos, em representação do Presidente angolano, João Lourenço, enalteceu todas as iniciativas que destacaram a resistência ao regime colonial português.
Os chefes de Estado que hoje celebraram os 50 anos da libertação dos presos políticos no Tarrafal, foram unânimes em apontar o antigo campo (hoje, museu) como "exemplo daquilo que nunca mais se quer."
Vinte e dois destes indivíduos, aprisionados na segunda fase do campo, da opressão anticolonialista, estiveram presentes no ato.
Um deles, Luís Fonseca, secretário executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) entre 2004 e 2008, usando a palavra como porta-voz dos presos políticos em causa, recordou um encarceramento que pretendia fazer desaparecer os ideais de liberdade, mas que produziu solidariedade, pensamento e até poesia e novas canções.
Defendeu solidariedade para com a Palestina, numa alusão ao conflito na faixa de Gaza (no mesmo país), bombardeada por Israel.
Considerou que a ofensiva israelita parece colocar apenas como opções “o extermínio ou o exílio”, à semelhança das práticas da era colonial portuguesa.
Mais de 500 pessoas estiveram presas nesse estabelecimento prisional, também chamado “Campo da Morte Lenta”, situado no norte da ilha de Santiago.
O mesmo é conhecido pelos maus tratos infligidos a prisioneiros detidos pela Polícia Política portuguesa (PIDE/DGS), devido à sua participação na contestação contra o regime colonial/fascista em Portugal e na luta pela independência das coloniais portuguesas em África, com destaque para Cabo Verde, Guiné-Bissau e Angola.
Trinta e seis pessoas não sobreviveram, das quais 32 mortas eram cidadãos portugueses contestatários do regime fascista, e presos na primeira fase do campo, ou seja, entre 1936 e 1956.
O campo reabriu em 1962 com o nome de Campo de Trabalho de Chão Bom, destinado a encarcerar anticolonialistas desses três países referidos, altura em que morreram dois angolanos e dois guineenses.
A libertação de quem se opunha ao domínio colonial português aconteceu poucos dias depois do derrube do regime fascista pela revolução do 25 de abril de 1974 em Portugal.
Do programa das comemorações constou um concerto com Mário Lúcio (Cabo Verde), Teresa Salgueiro (Portugal), Paulo Flores (Angola) e Karyna Gomes (Guiné-Bissau).
-0- PANA CS/DD 02maio2024